domingo, 2 de dezembro de 2018

A poesia de Ronaldo por Eudson e José Neres

RONALDO COSTA FERNANDES, POETA DE IMAGENS


by Igor Marques

Eudson Sousa Menezes
Pesquisador, graduado em História e graduando em Letras
José Neres
Coordenador do projeto O Sistema Literário Maranhense: Hipermídia e Hipertextos






A literatura maranhense vive em constante processo de renovação. Novos poetas, contistas, romancistas e dramaturgos buscam, apesar dos entraves do mercado editorial, manter a tradição do Maranhão como celeiro de grandes homens (e mulheres) de letras. Nessa vereda que procura manter essa tradição, o nome de Ronaldo Costa Fernandes merece destaque no campo da poética maranhense.
Ronaldo Costa Fernandes nasceu em São Luís do Maranhão a 29 de agosto de 1952. Graduou-se em Letras pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde concluiu também o mestrado em Literatura Hispano–Americana. Doutorou-se pela UnB com a apresentação da tese A ideologia do personagem brasileiro, que foi publicada em livro pela Editora da UnB em 2007. Residiu por nove anos em Caracas, na Venezuela, onde dirigiu o Centro de Estudos Brasileiro da Embaixada do Brasil. Foi também Coordenador da Funarte de Brasília de 1995 a 2003.
A produção literária de desse escritor transita entre romance, conto, poesia e ensaio. Seus dois primeiros romances são “João Rama” de 1979 e “Retratos falados” de 1984. Em 1998, com o romance “O Morto Solidário”, que foi traduzido e publicado para o espanhol, recebeu o Prêmio Casa de Las Américas. Em 1997, lançou o romance ”Concerto para flauta e martelo”, que foi finalista do Prêmio Jabuti de 1998. E em 2005 publicou o romance “O viúvo” e, em 2010, trouxe à tona “Um homem é muito pouco”, seu mais recente romance.. No campo do ensaio, publicou, em 1996, O “Narrador do Romance”, laureado como Prêmio Austregésilo de Athayde, da UBE-RJ. Como poeta publicou “Estrangeiro” de 1997, “Terratreme” de 1998, “Andarilho” de 2000, “Eterno Passageiro”, de 2004 e “A Máquina das Mãos”, de 2009, livro com o qual recebeu o prêmio de Poesia da Academia de Letras em 2010. Como contista, publicou “Manual de Tortura”, 2007.
Mesmo sendo um estudioso de elevada cultura, o escritor não deixa de ser também um “refém” da imaginação. Em seu poema “Imaginações Violadas”, toda tensão entre o racional e o irracional é fermentada pela imaginação. É necessário então externar essa tensão por meio do “pão poético”. Dessa maneira, poeta funde, em seus versos, ateísmo e religiosidade. Crer na não existência de deus, não é um princípio de religiosidade? Para o eu-lírico há, sim, esse princípio. A imaginação, o “padeiro”, a cada manhã fermenta no poeta essa pulsão entre negar e aceitar a imanência do divino. Então diante da manhã, a filosofia se esvai em migalhas, pois a filosofia não consegue explicar essa tensão entre o racional e o transcendente. Portanto, toda imaginação se tornar um ato transcendente. É isso que intriga o poeta: como as suas “imaginações são violadas” pelo transcendental?
O poeta maranhense Ronaldo Costa Fernandes representa, por meio de seus versos, a tensão maior da pós-modernidade: a descrença nos valores morais. A crítica poética não é apenas sobre a religiosidade, mas é também contra as ideologias totalizantes. No poema Potemkim-Kursk, o eu lírico põe em xeque a eficiência dos modelos sociais baseados na doutrinação ideológica. Não é apenas o socialismo que é posto em descrédito, mas todas as ideologias que pretendam uniformizar as relações humanas, tirando-lhes a vitalidade das mesmas.
O poeta também analisa os sentimentos do eu lírico ante o mundo pós-moderno. A pós-modernidade que tudo relativiza é o lugar de pulsão entre a moral que tudo permite e a religiosidade que põe restrições a ação. É, portanto, através da poesia que o poeta consegue da “forma ao informe”. A poesia, consequentemente, torna-se a catarse do eu lírico a esse estado de tensão entre o racional e o íntimo.
A poesia de Ronaldo Costa Fernandes demonstra claramente que é possível fazer versos que unam plasticidade textual, jogos imagéticos e extrema incursão pela logopeia, ressaltando o dito e suscitando o não-dito. É uma poesia a ser consumida sem pressa, com olhos atentos nos detalhes e nas armadilhas poéticas que espreitam o leitor a cada virar de página.


Publicado em O Estado do Maranhão, 15.06.2011

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