quinta-feira, 28 de novembro de 2013

A vida é um esquema, crônica José Ewerton Neto





Existe uma forte probabilidade de você ter sido originado de um esquema, caríssimo leitor. Duvida? Segundo uma revista científica até 7 % dos filhos, que os pais carregam orgulhosos nas mãos, não são do pai oficial. Além disso, ainda existem os adotados, os filhos de mãe solteira (às vezes, ninguém sabe quem é o pai - nem a própria mãe), os nascidos antes do casamento (a imensa maioria) etc. Enfim, o que não falta é esquema para dar vida a alguém.
Ora, se antes mesmo de vir à luz você já sofria com os esquemas: esquema para evitar que você venha ( camisinhas, pílulas etc.); esquema para dizer que seu pai é outro; esquema para arrumarem grana para lhe sustentar( chá de bebê etc.); imagine só o que não vem pela frente:

1.NA INFÂNCIA

O primeiro esquema do qual você é vítima é a tal da palmada na bunda, justamente no exato instante de sua chegada. Nessa ocasião, lhe dão uma palmada de verdade, para que você chore de mentirinha, aparentemente para que você possa respirar sem que você jamais tenha pedido ou faça questão disso. Ou seja, nem bem você começa a viver e já se depara com um esquema meio vagabundo de enganação. Haja berro!
Tendo sido introduzido nos esquemas da vida com um berro nada mais natural que você continue a usá-lo, para que o esquema agora funcione a seu favor. Se a comida não vem, berro; se a mãe não quer lhe dar peito, berro. Se ela some por alguns segundos, berro. Com menos de um ano você já é um especialista em esquema e ainda não sabe.

                                                       
        Um pouco mais grandinho, com a lei da evolução dos esquemas agindo a todo vapor, você já se aprimorou o suficiente para substituir o berro por outras enganações. O preferido passa a ser o beicinho. É beicinho para não ir à escola, beicinho para não tomar banho, beicinho para ganhar guloseimas e até beicinho para, simplesmente, chamar a atenção. Daí a rolar pelo chão e espernear, quando o beicinho não funciona, é um pulo, como também a disposição de pular para outras etapas mais audaciosas.


2.NA JUVENTUDE
A estas alturas você já tem idade suficiente – e experiência idem - para perceber que a vida não passa de uma batalha de esquemas: gente aprontando para cima de você e você tendo que reagir contra -atacando com outros esquemas. Claro, você ainda não chama esses esquemas de corrupção e acredita piamente que nem sabe o que é isso, tanto assim que você adora participar de passeatas, justamente contra ela.
Esquemas useiros e vezeiros nessa fase são: esquema para passar no vestibular sem estudar; esquema para pegar o carro do pai sem que ele saiba; esquema para dar uma fumadinha no banheiro, etc , sendo que, finda a juventude, você já entendeu que o que existe de mais prioritário nesse momento é pensar urgentemente num esquema para ganhar dinheiro sem ter que trabalhar.

É quando aparece a vocação de político.


3.NA MATURIDADE

A vocação de político não dando certo (o ‘burro’ de seu pai, péssimo em esquemas, sequer foi capaz de ter sido político para lhe facilitar a vocação), você continua se aprimorando em esquemas, agora para sobreviver. Na vida profissional: esquema para ser convidado a participar de algum esquema; esquema para puxar o saco do chefe ou esquema para puxar o saco do puxa-saco do chefe- a depender do seu posto na hierarquia. Na vida sentimental: esquema para que a parceira não venha a saber de suas amantes(ele) e esquema para fazer de conta que a gravidez é do marido ( ela).

 Embora já tenha certeza de que esquema é apenas um eufemismo para corrupção você não está nem aí para isso. “Que venha um esquemão salvador”, ainda sonha, a estas alturas do campeonato. Tem orgulho do próprio caráter e em se considerar cada vez mais um homem “esquemático”. Por sua vez, ela está se esquematizando com muito afinco para fingir que ainda é jovem - e dá-lhe cabeleireiro e botox

4.NA VELHICE

De repente, não mais que de repente e sem que disso tenha se dado conta, você se depara com uma fase em que precisa, urgentemente, de um esquema para enganar a morte. Haja cirurgias rejuvenescedoras!, Haja casar com gente mais nova (gigolôs e periguetes)!, Haja check-up mensal!, Haja propagar que seu médico lhe arrumou um esquema para enganar o Parkinson e o Alzheymer!, haja a todo custo tentar acreditar que se a vida é iludível a morte também é . Até que...

(Ah, se todos os corruptos soubessem disso. O nosso país seria, quem sabe, muito melhor):

Você acaba descobrindo que a morte, justamente ela, é incorruptível. Inapelavelmente.