O título é, evidentemente, extraído da caudalosa biografia escrita por Ruy Castro, livro à altura do biografado e de sua obra magistral. Nelson Rodrigues nasceu no Recife, em agosto de 1912, mas foi para o Rio ainda menino, no meado da década de 1920, acompanhando o pai, o combativo jornalista pernambucano Mário Rodrigues, então necessitado de novos ares profissionais.
Logo depois de instalado na Capital Federal daqueles tempos, Mário fundou mais um periódico, Crítica, e foi nele que Nelson deu os passos iniciais de uma carreira que se estenderia por cinco virtuosas décadas. Visceralmente homem de jornal, cronista torrencial, teatrólogo de primeira grandeza, frasista imbatível ("O dinheiro compra até amor sincero" e centenas de outras pérolas), personagem do Rio e do Brasil, Nelson Rodrigues teve a vida marcada pela tragédia, que se manifestou cedo, ao fazê-lo presenciar, na redação do jornal do pai, o assassinato do próprio irmão, o também jornalista Roberto Rodrigues. A culminância trágica foi o nascimento de uma filha cega, sobre quem Nelson produziu as páginas tocantes de um dos livros mais belos (e tristes) da Literatura Brasileira, o memorialístico A MENINA SEM ESTRELA.
A confecção teatral de Nelson Rodrigues o situa no topo da dramaturgia mundial contemporânea, sendo ele amplamente reconhecido, com a admiração incontida que nos é característica, como o "Shakespeare brasileiro". VESTIDO DE NOIVA, BEIJO NO ASFALTO e BONITINHA MAS ORDINÁRIA são alguns dos célebres títulos de suas peças imortais, muitas levadas para o cinema, sempre interpretadas pelos mais importantes atores e atrizes de nosso país. Nelson é autor, ainda, de um romance de tintas fortes, O CASAMENTO, em que faz picadinho da outrora sólida instituição matrimonial.
Nelson Rodrigues também cultivou, por toda a existência, a paixão futebolística, traduzida em amor incondicional ao Fluminense Futebol Clube e à Seleção Brasileira. Dedicou-lhes crônicas impagáveis, reunidas, pela Companhia das Letras, em três livros literariamente saborosos, O PROFETA TRICOLOR (Cem Anos de Fluminenese), À SOMBRA DAS CHUTEIRAS IMORTAIS e A PÁTRIA EM CHUTEIRAS. Do time de seu coração, Nelson chegou a dizer que se tratava do único verdadeiro tricolor, os outros eram apenas equipes de três cores...
O centenário de Nelson Rodrigues, que faleceu na véspera do Natal de 1980, aos 68 anos de idade, é um dos pontos mais altos de 2012 no panorama da cultura brasileira, merecedor de todas as comemorações programadas e mais alguma coisa.
FABIO DE SOUSA COUTINHO, advogado e bibliófilo, é membro titular do PEN Clube do Brasil e do Instituto Histórico e Geográfico do DF.