quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Horas tortas, poema RCF


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Aqui a lâmpada me vigia
com seu grande olho branco.
Pingam os minutos na torneira das horas.
O relógio é bússola
cujo norte é o próximo segundo.
Tudo me olha e controla
até mesmo a imagem no espelho
que passa de lá para cá
e sinto minha ausência
que não se fixa e não me olha.

E então busco o sono,
mas a insônia, prima da solidão,
segura minhas pálpebras abertas
com as pinças do sol da meia-noite.
A solidão escorre pelas paredes brancas
e um fio de silêncio cai do teto.



(do livro Memória dos porcos. Rio: 7Letras, 2012)


domingo, 26 de janeiro de 2020

Imaginaciones violadas, poema em espanhol RCF








El panadero ejerce el fermento
en la alquimia del horno
que todo lo asa: trigo y cotidianeidad.

Hay cola de espantos
para comprar el alimento
que ya está en nosotros:
rutina de existir cada mañana.

Hay algo de bíblico
en mi ateísmo descafeinado
y en el confuso café con leche
en el que las materias filosóficas
se redujeron, en mi mesa, a migajas.

La imaginación es el gran panadero,
por un lado me fermenta,
por otro me coloca en su horno:
la combustión de existir.

(do livro Eterno Passageiro, Ed. Varanda, Brasília, 2004)




Imaginações violadas




O padeiro exerce o fermento
na alquimia do forno
que tudo assa: trigo e cotidiano.

Há fila de espantos
para comprar o alimento
que já está em nós:
rotina de existir todas as manhãs.

Há algo de bíblico
em meu ateísmo amanteigado
e no confuso café com leite
em que as matérias filosóficas
se reduziram, em minha mesa, a migalhas.

A imaginação é o grande padeiro,
de um lado me fermenta,
de outro me coloca em seu forno:
a combustão de existir.

(do livro Eterno Passageiro, Ed. Varanda, Brasília, 2004)