É como pesar a pluma de um lado
e o espanto do outro.
Neste prato da balança o asco
e neste outro o sopro.
(de Andarilho)
Certa vez um pedaço de tempo
feito floco de neve
– fiapo de algodão doce
que se desfaz à lambida do toque –
caiu no meu casaco e não se dissolveu.
Permaneci com o tempo na lapela.
Me dei conta de que o pedaço de tempo
– corrosivo e nada friável –
que carregava na lapela
em vez de desaparecer
insistia em crescer
até me tomar o corpo todo
como o reconhecimento do erro
que é uma febre que não cede
ou a lembrança incômoda,
cão que nos segue
e ameaça nos morder a memória.
(do livro
Memória dos porcos. Rio: 7Letras, 2012)
(imagem: anne liori)