Os amigos poetas de Alice leram poemas num restaurante em Botafogo. Os poemas de Alice eram poemas bravios, mas ela os dizia de forma vaporosa. Percebi que andávamos devolutos. Minha vida estava devoluta, minha relação com Alice estava devoluta, meu destino era destino devoluto. Não era a maneira de dizer poesia comum em Alice. Aquela que estava ali não era aquela que escrevera os poemas. Eu me perguntava onde estava a mulher que escrevera os poemas. O restaurante tinha pátio interno que servia mais de bar que de restaurante. Era daí que os poetas, num palco minúsculo, diziam as poesias.
Um deles falou das flechas que lançamos desde que acordamos e não
alcançam os alvos. Eram poemas raivosos. Eram poemas roucos como quem esgotou a
fala no grito. E agora só restava o urro. Estávamos todos insulares ali. Eu
havia perdido intensidade. Alice não era
mais vibrante porque acirrada, Alice era a mais vibrante porque a poesia dela
era abrasiva.
O outro que lia poemas falava de dias curtos e noites alongadas, que cada
dia que passava a noite tomava o dia. Eles tinham em comum algo de Álvaro de
Campos, que afinal é o Walt Whitman português. Não era à toa que os três se
reuniram ali no bar. Falavam das mesmas coisas, quase no mesmo tom, embora a
leitura dos amigos poetas de Alice fosse leitura exaltada.
Havia poucas pessoas jantando, o bar estava cheio. Percebi que um sujeito
se acercava. Temi que tivessem por fim juntado alvo e dardo. O dardo era um
sujeito que não via há muito tempo. Era Ernesto, um amigo dos tempos de
ginásio. Agora era médico, recém-formado.
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