quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Barcelona, poema RCF




Sento-me no café,
a placidez da praça com seus pombos,
a inexatidão do foco das nuvens,
o amargo do adoçante,
e a canção pedinte de um acordeão.
Percebo que não estou no estrangeiro
nem que falam em língua catalã,
aí compreendo que sempre estive sentado num bar
e que a multidão passa, indiferente e pedestre.

Na cidade velha, Cervantes
morou de frente pro mar
– quem sabe não chegou a pensar
em Dom Quixote como marinheiro?
Ruas tortas de Miró e Gaudí
amolecem as molduras das janelas
fechadas para se protegerem
de tanto peixe e dentes solares.
O mapa de papel nunca existe
antes de eu desenhá-lo
com o papel mais fino da memória
e estrias de pés alucinados.
Neste café, estive moído
cada grão de pesar
esmagado na trituração
do bairro velho que me habita.



(A máquina das mãos, 2009)
 
imagem retirada da internet: gaudí

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