Claudio Sesín |
Adelto Gonçalves (*)
I
Quem estuda as letras hispano-americanas
nas universidades brasileiras, dificilmente, entra em contato com a literatura
contemporânea dos países vizinhos. É o que se dá com a literatura argentina, da
qual se conhece Jorge Luis Borges (1899-1986), Adolfo Bioy Casares (1914-1999),
Julio Cortázar (1914-1984), Roberto Arlt (1900-1942), Horacio Quiroga
(1879-1937), Oliverio Girondo (1891-1967), Juan José Saer (1937-2005),
Alfonsina Storni (1892-1938), Juan Guelman (1930), Rodolfo Alonso (1934) e
outros, mas quase nada da geração mais recente. E não se diga que seja uma geração muito jovem
porque a maioria já passou dos cinqüenta anos de idade.
Não se pode jogar a culpa sobre os
professores. Se hoje este articulista conhece uma boa parte de autores
argentinos só tem a agradecer ao seu orientador no mestrado, o professor Mario
Miguel González (1938-2013), nascido em Alta Gracia, Córdoba, que sempre se
preocupou em falar dos poetas que apareciam na Argentina, ainda que estivesse
radicado no Brasil desde que fora contratado pela Universidade de São Paulo
(USP) em 1968 e fosse brasileiro naturalizado. Com o desaparecimento de González
em fevereiro último, perderam a literatura argentina e a hispano-americana
talvez o seu maior divulgador no Brasil.
Esse desconhecimento pode ser
atribuído à devastação cultural promovida pelas ditaduras militares de direita
que infelicitaram tanto Brasil como Argentina e à crise econômica que levou ao
fechamento de vários suplementos e revistas culturais tanto lá como aqui,
resultado talvez do empobrecimento intelectual das classes médias. Na segunda
metade da década de 1970, o Versus,
de São Paulo, jornal-tablóide cultural criado pelo jornalista Marcos Faerman
(1943-1999), era uma espécie de filhote da revista de crítica cultural Crisis, que circulou em Buenos Aires de
1973 a 1976 e teve em sua direção, primeiro, Ernesto Sábato (1911-2011) e,
depois, o uruguaio Eduardo Galeano (1940), que, em 1976, acossado pelo regime
do general Jorge Rafael Videla, transferiu-se para Barcelona e de lá enviava
colaborações para o Versus.
Àquela época, diga-se de passagem,
havia na Argentina, ao contrário do Brasil, pelo menos alguns empresários que
tinham preocupações culturais e praticavam o mecenato. Era o caso do
empresário, advogado e engenheiro-agrônomo Federico Vogelius (1920-1986), que
fundou a Crisis à época do retorno do
peronismo ao poder e a manteve até que a ditadura militar o atirou ao cárcere
por três anos, período em que passou por várias sessões de tortura. Em 1986, Crisis voltaria a circular, também por
empenho de Vogelius, mas por poucos meses. Já as despesas de Versus saíam das economias domésticas de
Faerman e do seu salário como repórter do Jornal
da Tarde, de São Paulo.
II
Mas a que vêm estas reminiscências?
Vêm a propósito de dizer que, tal como no Brasil de hoje, há uma poesia em
grande efervescência na Argentina e que, da mesma forma, é pouco conhecida
porque, decididamente, houve em ambos os países um empobrecimento cultural
avassalador. Entre os nomes que constituem a nova poesia argentina, pode-se
citar Claudio Sesín, Eduardo Dalter, Arturo Herrera, José Emílio Talarico,
Sofía Vivo, Alejandro Acosta, Mirta Popesciel, Daniel Chirom, Ricardo Ruiz,
Elizabeth Molner, Gisele Rodríguez e outros.
Um poeta que constitui um exemplo dessa
nova poesia argentina é Claudio Sesín (1959), praticante de “uma poética renovadora,
que retoma o projeto lírico, sem abandonar o compromisso com a crítica social”,
na definição do poeta e crítico Ronaldo Cagiano, um dos poucos que têm tido a
preocupação de reconstruir as pontes culturais com a Argentina e outros países
latino-americanos.
Poeta de Catamarca, região noroeste
da Argentina, vizinha a Oeste do Chile, de paisagens montanhosas e crepúsculos deslumbrantes,
cuja capital San Fernando del Valle de Catamarca fica a mais de mil quilômetros
de Buenos Aires, Sesín sempre foi um poeta cercado pelos cumes nevados da
cordilheira e isolado em sua província. Como se tivesse optado por viver um
desterro permanente e que, por isso, reluta em largá-lo. Até mesmo quando sai
de sua terra, a viagem é parte do seu exílio. É o que diz no poema “El árbol”
que faz parte de seu livro El Signo del Crepúsculo
(Buenos Aires, Editorial Dunken, 2006):
Cuando uno se dirige a la frontera,
el
viaje es una parte del exilio. (....)
(....)
Sentir y hasta querer este destierro.
El
hombre se acostumbra a la tristeza.
Um
árbol infinito con ramas de tinieblas
ensombrece
la ausencia, la apacienta.
Donde
voy a llorar, entre qué brazos?
Siempre
es llorar por uno,
este
viajar en sombras por la niebla.
III
Como observa o poeta Arturo Herrera
no prólogo que escreveu para este livro, a poesia de Sesín é exatamente oposta
à retórica e contorções lingüísticas que se vê em demasia na poesia
pós-moderna. Para ele, este livro deveria ter como título Libro de la Permanencia ou apenas Permanencia porque “a maioria das composições sustenta este
conceito como uma solitária pedra na palma da mão aberta e ao seu redor se
modulam as distintas sensações do tempo”. O título do livro, no entanto, provém
do poema “El signo del crepúsculo” que fecha a obra e que, em sua estrofe
final, diz:
(...) Hoy me dejo llevar a la extensión del tiempo
y
voy, un peregrino de mi suerte,
buscando
qué lugar, qué detalle en penumbras
en
quién sabe qué imagen, qué piel o qué tristeza,
esta
felicidad por los ocasos.
De fato, a passagem do tempo parece
fascinar o poeta e constitui palavra-chave de El Signo del Crepúsculo, ao lado do sentimento de perda que
acompanha o homem quando encara o ocaso de sua vida e a inutilidade de acumular
tesouros na terra, como se pode ler também no poema “Los comediantes”:
(...) A veces creo que el tiempo que nos lleva
es
un viejo gitano en sus caprichos,
que
nos compra y nos vende con sus dichos,
y
tan sólo nos deja en nuestras manos,
un
sueño sin edad de algún verano
y
el volver a vibrar del precipicio. (...)
IV
Claudio Sesín nasceu em Villa
Dolores, Valle Viejo, mas passou toda a sua infância em Pomán, província de
Catamarca. Foi em 1983 que começou a publicar seus escritos em jornais de
Catamarca, especialmente poesia, prosa poética e relatos breves. Desde 1986,
integra o Movimento de Escritores pela Liberação (MEL), de Córdoba, e em 1987
passou a fazer parte da redação do periódico cultural El Cronopio, daquela instituição. De 1996 a 1997, colaborou com as
revistas Cain e Gaia, de Catamarca, e Cultura
Abierta, de Buenos Aires.
Em 1993, publicou o seu primeiro
livro de poesia, La Barbarie, edição
de autor. Em 1997, publicou o seu segundo livro, El Círculo de Fuego, também edição de autor. Em 2008, lançou El Libro de los Poemas Casuales/O Livro dos
Poemas Casuais (Buenos Aires: Editorial Dunken) em edição bilíngüe com
traduções para o português por Anderson Braga Horta e Antonio Miranda.
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EL
SIGNO DEL CREPÚSCULO,
de Claudio Sesín. Buenos Aires: Editorial Dunken, 80 págs., 2006. E-mail: info@dunken.com.ar Site: www.dunken.com.ar
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(*) Adelto Gonçalves é
mestre em Língua Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-americana e doutor
em Literatura Portuguesa pela Universidade de São Paulo e autor de Gonzaga,
um Poeta do Iluminismo (Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1999), Barcelona
Brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999; São Paulo, Publisher Brasil,
2002) e Bocage – o Perfil Perdido (Lisboa, Caminho, 2003). E-mail:
marilizadelto@uol.com.br
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