quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Açougue, poema RCF





Este açougue
onde estão pendurados
a carne dos meus pecados
os miúdos dos meus vícios
é um bricabraque de culpas.

Este açougue
nervos expostos
retorcidos músculos de remorso
massa tensa que inflama
os pesares e o peso da dúvida
que balança a balança
que me desequilibra.

Há tempo que não ligo
para a carne moída pelo tempo
e os ossos do ofício
que me fazem cão de pouca guarda,
exagero de ganchos,
puro exercício da vontade espúria,
cutelo do medo que me divide
afiado matadouro dos olhos alheios.

Aqui as juntas desmembradas do convívio
a sensação de que frito
na luz azul que mata insetos,
tudo poderia ser ligamento com o mundo
se a mente e a minha carne não fossem de segunda.



(do livro A máquina das mãos, Rio:7Letras, 2009)


imagem retirada da internet: yves lecoq

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