Sempre me impressionaram os rios secos,
as margens olhando para o leito de areia,
o suposto fluir do que um dia existiu.
Depois, se os rios correm para o mar,
que mar seco é esse para onde corre o rio seco?
Sem a água do rio,
gozo úbere e fértil,
esterilizam-se.
Estão separadas uma da outra
por uma hipótese baixa, central,
ora, se a água
é quem cria os rios,
que fazem as margens desprovidas
de sua função?
As margens são penólopes sem tapete,
ruminando o tempo, a secura, o tear;
são visionárias e persistentes,
sabem que um dia as águas voltarão
e, por isso, entrarão em cio,
recompensadas pelo espetáculo de vigiar o nada,
o pó, o rastro de praia,
o solado de greta de um leito que imita a vida.
(A máquina das mãos, Rio: 7Letras, 2009)
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