Conceição Freitas
O poeta Ronaldo Costa Fernandes lança hoje o livro de poemas. (Veja matéria de Nahima Maciel em Diversão & Arte, edição de hoje). Ronaldo é puro concreto em forma de poema. Pessoalmente, é grama verde do jardim — suave e discreto. A capa de O difícil exercício das cinzas é um gramado amarelado, seco, mas com vagas lembranças da chuva.
O maranhense-brasiliense Ronaldo Costa Fernandes é considerado, pela crítica mais atenta, um dos maiores poetas brasileiros vivos. É preciso ser forte para ler os poemas de Ronaldo. As imagens, mesmo as eróticas, ressoam como brita, areia, cimento e água rolando na bocarra da máquina de fabricar concreto. A comparação que faço é imageticamente feia, mas os poemas de Ronaldo têm a beleza de um palácio de Niemeyer.
O novo livro do poeta é brasiliense — do mesmo modo que um novo livro de Drummond seria mineiro ou carioca e uma nova obra de João Cabral de Melo Neto, pernambucano. O poeta é um homem e a si mesmo, sua terra, suas tramas, seus pesadelos, seus desejos, sua inquietude. Brasília está no poema do calor intenso, no Planalto em chamas, no Pai nosso que estás no céu de Brasília. Não é fácil ser brasiliense e Ronaldo nos conduz, pedra sobre pedra, nessa dificuldade.
Brasília está em O caranguejo:
"A cidade não é uma estrela jogada no deserto, /e,
sim, um caranguejo imóvel,/com inúteis garras que se ficam na areia./A cidade
murmureja a vontade quente,/há no mormaço a esquivança dos desejos,/move-se a
máquina pouco mercante,/a máquina sem barra e lenta,/aqui não entram navios,
embora tenhamos/porto e amarras — o porto é singular,/está em cada porta
migrante./A cidade se recompõe a cada manhã/mulher sem desjejum, rosto
dormido/de pesadelos, cabelos/em desalinho de uma névoa estrangeira.”
Brasília, escreve o poeta, “não se contorce, circense,/no picadeiro dos grandes espetáculos,/é ainda uma província de poderes,/embora seus poderes não sejam provincianos,/o Planalto é um risco de vidro/que insiste em sua pose de guarda britânico./As esculturas é que me encantam: Esta é a nossa Pompeia particular/e cada escultura é um candango/petrificado pela larva/da construção desta Atenas armada de cimento.”
Em seguida, o poeta passeia pelas três pontes que ligam o Plano Piloto ao Lago Sul: “A do Gilberto Salomão é apenas uma ponte vecchio,/plana e regular, como uma rua:/ a Costa e Silva é graça e garça, voo flagrado,/asa cortada de pássaro e em mármore branco fixada;/por fim a terceira do Sul, a que um dia se pensou/ em chamar de a do Mosteiro,/cobra gigantesca, suspensa por si mesma,/zepellin de ferro, contorcionismo de estruturas (…)”
Brasília e os poemas de Ronaldo Costa Fernandes são belos, duramente belos, e é preciso ser forte para ouvir o canto áspero, porém melodioso, do concreto.
Brasília, escreve o poeta, “não se contorce, circense,/no picadeiro dos grandes espetáculos,/é ainda uma província de poderes,/embora seus poderes não sejam provincianos,/o Planalto é um risco de vidro/que insiste em sua pose de guarda britânico./As esculturas é que me encantam: Esta é a nossa Pompeia particular/e cada escultura é um candango/petrificado pela larva/da construção desta Atenas armada de cimento.”
Em seguida, o poeta passeia pelas três pontes que ligam o Plano Piloto ao Lago Sul: “A do Gilberto Salomão é apenas uma ponte vecchio,/plana e regular, como uma rua:/ a Costa e Silva é graça e garça, voo flagrado,/asa cortada de pássaro e em mármore branco fixada;/por fim a terceira do Sul, a que um dia se pensou/ em chamar de a do Mosteiro,/cobra gigantesca, suspensa por si mesma,/zepellin de ferro, contorcionismo de estruturas (…)”
Brasília e os poemas de Ronaldo Costa Fernandes são belos, duramente belos, e é preciso ser forte para ouvir o canto áspero, porém melodioso, do concreto.
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