Teus rios são feitos
de água
mais intestina: a
água da terra
revolta que se move
num
enorme estômago de
areia,
barro e água, um
tempero
que nem franceses,
nem portugueses,
muito menos
holandeses,
puderam acalmar na
azia dos tempos.
Tenho em mim um
bumba-meu-boi
numa caixinha de
música:
a cabeça roda os
pinos e os brincantes
bêbados se apresentam
mambembes
no pátio da casa do
desembargador.
Com os anos, rolei
mundo,
esta outra caixa sem
música,
que vai silenciando a
memória,
e os casarões de pé
direito alto
arquitetaram saudades
e fotos
nos azulejos da
infância
que se despregam
fácil
e são substituídos
por outros falsos:
são gente de outra
época
que se prega na
parede dos dias.
Meu patrimônio são
duas peças de roupa:
uma de marinheiro
com que posei, na
fotografia, de órfão
e outra de índio
para um eterno
carnaval
em que ia contra a
corrente
de gente e versos,
que são correntes de
gosto
e compostas de vazio
e tombamento.
Tenho quatrocentos
motivos
para ser uma cidade
em constante viagem,
sem paradeiro que a
sossegue
e sem destino que a
cumpra.